terça-feira, 21 de novembro de 2017

O mergulho da libélula

Quando menino, fui criado em beira de rio. Cansei de passar o dia inteiro curtindo de tudo que o rio me oferecia. Banhava tanto, que as pontas dos dedos enrugavam.

Lembro de algo que chamava bastante minha atenção; as libélulas voando e tocando com a cauda na água. Não sabia porque elas faziam aquilo, mas achava que havia uma razão muito forte. Só depois de algum tempo é que fiquei sabendo que são as fêmeas soltando seus ovos. Naquela época chamávamos estes insetos de Macaquinhos.

Há uma espécie muito interessante que, em vez de jogar os ovos, pousa em uma planta, coloca a cauda dentro d’água e deposita-os nos caules, para ficarem protegidos de predadores.

Existe ainda outra espécie que mergulha totalmente na água, e com a ponta da cauda faz cava no caule para colocar os ovos. Quando isso acontece a liberdade de voar é temporariamente suprimida e o risco de morrer, por falta de oxigênio, é eminente. Retornando à superfície, é necessário um esforço tremendo para que as asas voltem a bater e elas peguem voo novamente. Todo este sacrifício é com o único propósito de pôr os ovos em lugar seguro e garantir o nascimento de outro igual.

Assim é a vida.... Toda reprodução carrega o princípio de que é necessário sacrifício para que o outro tenha vida. O início da existência de um, exige colocar, mesmo que momentaneamente, a vida de outro em risco. Quem sabe não foi isto que o filósofo romano Sêneca quis dizer com: Viver é correr o risco de morrer!
 
Observando as libélulas, sem consciência da morte elas apenas vão vivendo e se reproduzindo. Infelizmente há pessoas que, mesmo com a consciência da eternidade, vivem sem reproduzirem nada. Parafraseando o apóstolo Paulo: Se o viver produz vida, então a morte passa a ser lucro.

Cristo foi profundo sobre isto quando disse aos seus discípulos que, se o grão de trigo, caído na terra, não morrer, ficará só; se morrer, produz muito fruto. Ele estava se referindo à sua morte na cruz do calvário, dando vida plena para uma humanidade condenada à morte eterna. Logo, sem morte a vida humana não se eterniza.

Pensando bem..., o tempo tornou a morte e a vida parceiros de existência, pois um depende do outro para se consolidarem. É morrendo que se vive; e quem vive, um dia morre. Bem disse o grande sábio: Há tempo de morrer e tempo de viver.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

COEXISTIR

Hoje, ao cair da tarde, contemplando o pôr do sol da sacada do meu apartamento, meus olhos se deleitavam com a beleza dos raios do sol incidindo sobre as nuvens. À medida que o tempo passava, o grande astro luminoso mergulhava vagarosamente na linha do horizonte. Fiquei ali quieto até o céu escurecer.

O entardecer para mim não é nostálgico, é sempre um momento especial de boas recordações. Das muitas lembranças, descrevo um final de tarde que marcou muito minha vida. Era um dia de inverno, e uma garoa caía lentamente, deixando o clima bem fresco. Sentado em um mocho pequeno, sob as folhagens da goiabeira do quintal lá de casa, presenciei aquela transformação com um olhar estupefato. Como poderia ser isto!?

Daquele casulo saía uma linda borboleta, de asas grandes e de um azul cintilante indescritível. Concluída a metamorfose, meus olhos testemunharam os primeiros voos daquele belo inseto. Por algum tempo fiquei com a mente imersa no surgimento daquela extraordinária criação de Deus.Pela primeira vez parei para pensar sobre a vida além da existência humana. Foi a partir daí que passei a ver o mundo ao meu redor com um olhar diferente. Entendi que a vida compreende um conjunto de existências, que coexistir é que nos torna maiores do que já somos. Meus olhos se abriram para a realidade de que, toda a criação é obra das mãos de Deus.

Já satisfeito com o que tinha experimentado, levantei, peguei o mocho, e entrei em casa levando o universo comigo. Esta lembrança foi tão nítida na minha mente, que só depois é que percebi que eu estava em meu apartamento, e não na casa de infância.

Foi uma recordação que me fez muito bem, pois até sonhei que voava com as asas da borboleta!            

Cristo a esperança da glória!

Diante de tudo que se tem visto e ouvido, é inegável que o desespero tem assolado a humanidade, de tal forma, que tornou-se doença mortal. A busca desenfreada por uma vida gloriosa e isenta de dor é como um buraco sem fundo que leva as pessoas cada vez mais para baixo. Desesperados, muitos transformam o viver em uma eterna luta de superação de problemas. Esquece-se que o desespero nada mais é do que a negação interior de que a vida tem suas contingências, e de que somos seres humanos limitados em todos os aspectos.

A negação de nossa natureza humana nos consome, nos leva            
a exigir de nós e dos outros o que nunca alcançaremos neste mundo; a perfeição. Kierkegaard em “O desespero humano”, fala que o desespero se manifesta de duas formas: Não querermos ser nós mesmos, ou a vontade desesperada de sermos nós mesmos. Paulo, apóstolo dos gentios, viveu este desespero, e só superou suas angústias quando admitiu sua miserabilidade humana. Foi assim que ele aprendeu a lidar com as pressões da vida sem, no entanto, deixar-se ser consumido por elas. Os discípulos de Jesus também enfrentaram esta luta, a ponto de serem avisados pelo próprio Cristo que as aflições deste mundo seriam inevitáveis.

Só há uma saída para que não sejamos engolidos pelo desespero; fazer de Cristo nosso ânimo, nossa motivação maior de viver. Quem busca refúgio em Cristo, não é dominado pelo desespero, porque experimenta paz em quaisquer circunstâncias da vida. 
Cristo a esperança da glória!                        

quarta-feira, 15 de março de 2017

Os desfiles da vida

Mais um ano em que o desfile na passarela do samba foi mostrado em detalhes pela televisão brasileira. Na verdade, já a um bom tempo os acontecimentos do mundo todo se transformaram em meros “desfiles” que não cessam de passar à vista da plateia.
A televisão não deixa escapar um. Tem desfiles de todos os gostos. Cada desfile que passa vai produzindo alegria, euforia, tristeza, raiva, choro, admiração, rivalidade, desespero e até indiferença.
Os “desfiles” do cotidiano são diferentes dos da passarela, já que nestes as pessoas se expõem para serem aplaudidas, enquanto naqueles as pessoas são expostas para produzirem audiência. Atualmente, entre os “desfiles” em destaques, que prendem milhares e milhares de pessoas na televisão, estão: Os refugiados da Síria desesperados para encontrar o chão do sossego; o Donald Trump exibindo sua intolerância e discriminação para com os imigrantes; a vergonhosa podridão da política brasileira e a fome matando milhões de crianças no mundo todo. Daqui a um tempo esses “desfiles” serão empurrados por novas comissões de frente, e outras novidades vão entrar na passarela da informação.
E é neste samba da vida que a plateia vai se tornando cada vez mais insensível às dores e sofrimentos da multidão. As tragédias são tantas, que de tanto chorar as próprias dores, não dá nem tempo de chorar com os que choram. Como diz Chico Buarque: “E cada qual no seu canto. Em cada canto uma dor. Depois da banda passar. Cantando coisas de amor”.
Os olhos estão obscurecidos diante da realidade de que, depois que o “desfile” passa, fica apenas uma passarela encardida pela sujeira da indiferença. No final de tudo, vale o que disse o sábio Salomão: Nada faz sentido! Nada faz sentido! Porque só o temor a Deus é que dá sentido a tudo.