sábado, 31 de outubro de 2009

NUANÇAS DA GRAÇA

Embora saiba que a graça de Deus, na sua totalidade, não pode ser explicada e nem entendida pela mente humana, todavia sei que é possível detectarmos algumas nuanças dela, que somente são reconhecidas por aqueles que não buscam explicações plausíveis, mas apenas vivem e usufruem intensamente os seus benefícios.

Sem sombra de dúvida, uma das qualidades de alguém que tem intimidade com Deus é quando este alguém aprendeu a viver pela Sua graça. Um dos matizes da graça que mais me chama atenção é o efeito contrário que ela gera no indivíduo em relação aos padrões e valores terreais. Enquanto o “ser” representa para muitos, ter encontrado o tesouro perdido nas profundezas do oceano; para quem vive pela graça o “ser” representa ser o próprio tesouro que torna o espetáculo da vida mais bonito, e que nos capacita a ver e usufruir também das riquezas e maravilhas deste mesmo oceano.

Pela Graça que me alcançou, me rendi diante da graça que contradiz a razão humana; que torna louca a sabedoria deste mundo; que faz as coisas vis e desprezíveis aniquilarem as que parecem ter valor, com o fim de confundir os que se acham sábios. Por um bom tempo, como cristão, vivi debaixo da graça de Deus sem, no entanto, experimentar a “loucura” desta graça. Vivia no limbo da graça. Porém, pela misericórdia de Deus, fui acordado a tempo de não permitir que a religião aliada com a instituição, continuasse me sufocando e impedindo-me de ser marcado pelos lampejos do favor eterno do Pai.

O peso da doutrina sem o aquecimento da graça cauterizou minha mente e me acorrentou a uma vida sem graça, estreita e enviesada. Preso pela ditadura dos padrões evangélicos, e não cristãos, deixei de usufruir o que foi intitulado de abominável e vulgar, pela religião. Ceguei, por um tempo, para os detalhes ignotos da vida, que produzem os prazeres mais sublimes para a sobrevivência de um “ser” criado conforme a imagem de Deus. Hoje, tudo faz sentido. Porque pela graça de Deus, aprendi a tirar proveito de tudo; aprendi a valorizar muito mais as coisas que produzem resultados permanentes, tais como: Ir ao cinema para assistir um bom filme com minha esposa; emocionar-me com a leitura de um romance e de uma poesia; ouvir o canto de um pássaro ao amanhecer; condoer-se com o olhar de um adolescente no semáforo; relaxar ouvindo a melodia de uma boa música; contemplar a linha do horizonte no oceano; sentir a brisa da aurora da manhã; andar na praia ao entardecer; beber um bom vinho; gritar “gol” com meu filho; comprar um bom livro para minha filha; papear na roda de amigos; assistir uma boa peça teatral; usufruir o silêncio da madrugada; extasiar-se diante do inexplicável; sorrir das minhas próprias limitações; andar de mãos dadas com as diferenças pessoais; enfim, decidir simplesmente viver e viver cada minuto com toda intensidade.

A essas alturas da minha vida, quero viver integralmente o que a graça de Deus me presenteou, independente de qualquer coisa. Quero viver a liberdade de ser livre, mesmo que seja tachado de louco, até porque, é impossível viver a liberdade sem experimentar a “loucura” da graça. Prefiro ser louco, não da mente, ou ser demente, mas louco para esvaziar a mente e ser cheio da mente de Cristo. A graça de Deus foge à razão humana; é algo extraordinário, porque faz a gente tocar no intocável, ver o invisível, compreender o incompreensível, tolerar o intolerável humano, e até mesmo acreditar que os “loucos” também amam (e quem sabe verdadeiramente amar?).

Conclusão. De imediato a graça de Deus me livrou do inferno das trevas, e no decorrer do tempo vai me livrando do inferno da terra. A graça também me libertou de uma vida sem-graça, e de graça me deu uma nova vida cheia de graça. Isso aconteceu porque entre a sanidade humana e a “loucura” da graça, escolhi esta, que si manifesta em Deus, por meio de seu filho, Jesus!

sábado, 17 de outubro de 2009

Lembranças da infância

Os tempos mudam! O que era especial ontem, hoje já não se dá tanta importância. Lembro-me dos momentos especiais de final de semana, com a família toda, reunida na copa-cozinha ao redor de uma grande mesa feita de pau d’arco. Momentos inesquecíveis que não voltam mais. Naqueles momentos, pelo fato de estarmos todos juntos, tudo era festa, a alegria inundava o ambiente e isso gerava uma mistura de prazer e felicidade. Qualquer coisa era motivo de sorrir e dá gargalhada, ríamos por bobagem, a ponto de derramarmos lágrimas. Havia liberdade de ser quem realmente éramos sem medo de sermos rejeitados.
Domingo! Significava mesa cheia (Só quando começamos a estudar que passamos a dizer mesa farta). A galinha caipira não podia faltar, e quem melhor preparava era papai. Ele também fazia o suco de cupuaçu, que ele chamava de vitamina KB12, para nós era o melhor suco do mundo. Sentíamos orgulho de dizer isso, ele também, é claro! Mamãe se realizava ao ver toda a família reunida. As coisas aconteciam naturalmente. Havia a hora do almoço e da janta (dizer “almoçar” e “jantar” era coisa de granfino, ou seja, de gente rica). Ninguém comia primeiro até que todos estivessem na mesa. Ai daquele que sentava para comer “nu de cintura pra cima”, para meus pais era inadmissível. Só havia um momento de silêncio, quando mamãe fazia a oração de agradecimento a Deus pela comida e pela família.
Hoje, a maioria das famílias não prepara jantar, fazem apenas um lanche, que no final das contas acabam comendo mais do que se jantassem realmente. Na minha infância, o jantar era preparado todos os dias, e servido às 6:00h da tarde. De vez enquando mamãe preparava uma sopa, era tão forte e saborosa que quando comíamos, suávamos por todos os lados do corpo (eu sei, hoje é por todos os poros). Nos dias de lua cheia, antes de dormir, nos reuníamos na área livre enfrente da nossa casa, que meus pais chamavam de “terreiro”, e ficávamos papeando até dá sono. Papai gostava de cantar a música de Nelson Gonçalves “Boemia” e mamãe cantava músicas de Ângela Maria. Tinha uma música que até hoje me lembro dos dois cantando: “Fiz uma casinha branca lá no pé da serra pra nós dois morar, fica perto da barranca, do rio Paraná...”. Havia o momento de contar estórias. As estórias que Papai contava eram demais. Só quem sabia contar melhor era ele. A nossa estória predileta era a da onça pintada; pedíamos pra ele contar várias vezes, e ele contava que parecia de verdade. Já mamãe só contava estórias de assombração e visagem, eram as últimas estórias que ouvíamos, porque quando ela terminava, todos iam dormir escondidos debaixo dos lençóis. Mas tudo isso era significativo e excitante para nós.
Minha família sempre aproveitava o tempo de cada fruta para ser motivo de estarmos juntos e fortalecermos nossa unidade. Tinha o período do milho. Papai comprava as espigas de milho para fazer canjica e comermos milho cozido. O preparo da canjica dava uma trabalheira doida. Tínhamos que ralar o milho. A primeira vez que ralei foi terrível, porque ralei também os dedos, e dessa vez a festa ficou sem graça pra mim. O consolo foi que mamãe deixou que eu comesse bastante canjica. Outro tempo bom era o tempo da juçara. Meus pais não gostavam de comprar juçara pronta, eles mesmos preparavam. Deixavam a juçara de molho até amolecer a polpa, depois colocava no alguidar e amassava com as mãos até toda a polpa se desprender dos caroços, e só então usava a peneira, feita de fibra de palha de arumã, para coar o líquido da juçara. Entre outros momentos, tinha o café da manhã que era recheado de: cuscuz de milho, beiju, macaxeira cozida, batata doce, cará e o leite mugido.
À medida que fomos crescendo, essas coisas foram ficando para traz. Que pena! Sinto saudades! A correria para chegar ao trabalho e no colégio à tempo; a ânsia pelo prazer de viver coisas novas; o próprio desenvolvimento natural daquela geração; o avanço da tecnologia trazendo a televisão; o crescimento demográfico, etc., foram sufocando as coisas simples que vivíamos. Agregado a tudo que o desenvolvimento trazia, passamos a ver nosso pai preso pelo alcoolismo. E aí foi triste, porque tudo desmoronou. Só que a partir daí, é outra história. Fico por aqui. Em outro momento contarei essa parte. Porque o que quero mesmo, é evidenciar o lado lindo e maravilhoso que vivi com meus pais e meus irmãos. Sempre que lembro essas coisas, fico feliz, além de ser contagiado por um desejo muito forte de continuar vivendo e usufruindo coisas semelhantes com a minha família atual. Quando olho para traz e lembro-me destes momentos, só posso dizer que: Foi Deus quem me abençoou com estes momentos inesquecíveis.