domingo, 20 de março de 2011

O olhar e o ver

"Olhe para os pássaros, olhe para as flores...”. Como Alguém que teve uma missão tão grande a realizar encontrou tempo para contemplar a natureza, os pássaros, as flores? A visão de Jesus penetrava na beleza da criação com tanta intensidade que suas palavras reverberavam o imenso cuidado de Deus pelas aves do céu e pelos lírios do campo. Dizem que os olhos vêem o que alma deseja. Ele disse: A alma alimenta-se do que os olhos vêem, e se os olhos forem bons todo o corpo terá luz.
Há aqueles que cegaram diante da beleza da vida, porque tem olhos, mas não vêem. Bem inquiriu Goethe: "Do que vale olhar sem ver?" E André Gide responde: "Que a importância esteja no teu olhar, não naquilo que olhas." Há também aqueles que perderam a sensibilidade de ouvir a cadência da melodia do viver, porque tem ouvidos, mas não ouvem.
A alma só contempla quando o olhar copula com o ver. O ver é a capacidade humana de enxergar; o olhar é a capacidade de deixar o coração ver primeiro; é quando a percepção antecede a visão. Ao contemplar os pássaros e as flores Jesus comungou com a liberdade de viver sem as algemas da ansiedade. A ansiedade torna a visibilidade da alma turva, e é aí que somos tragados pelo engano, porque ficamos entre a cegueira e a visão; o torto se torna direito e o direito torto. Quem vê e não consegue olhar é como ter catarata nos olhos, fica como que meio cego. E uma das dificuldades é não conseguir olhar as pessoas como realmente são, vidas que se movem em liberdade, e não arvores presas em seus próprios movimentos.
Os olhares falam mais alto do que um simples ver. Um olhar expõe o que está na alma, denuncia as intenções da mente e revela o que sente o coração. Um olhar pode ajuda o outro a reconhecer quem realmente é. Foi com o olhar de Jesus que Pedro conseguiu enxergar sua feiúra interior e ao mesmo tempo sentir a compaixão emanada através dos olhos do seu Mestre. Há momentos na vida que o olhar soa mais alto que o tom da voz, porque dependendo da situação, pode revelar aquilo que a boca não consegue dizer. A boca pode silenciar diante da morte ou da despedida, no entanto, o olhar permanece até perder de vista.
A vista cansa quando as pálpebras permanecem levantadas; o olhar se perde no vazio quando a alma silencia. Mas há momentos em que o olhar e o vê refletem o mesmo brilho: Quando os olhos estão encharcados de amor. Sempre que os olhos de duas pessoas que se amam se encontram, o olhar e o vê se tornam uma só coisa. E é só assim que se descobre o segredo do verdadeiro amor: “Olhando olhos nos olhos”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário