domingo, 11 de abril de 2010

QUIETUDE

Às vezes fico a me perguntar se alguma vez, por alguns instantes, já vivi na íntegra esta orientação divina: “Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus” (Sl.46:10). Refletindo sobre isto, fui levado a admitir que, depois da fase da inocência, já faz muito tempo que deixei de usufruir da verdadeira quietude.
Misturei as coisas. Fui iludido pelo que parece ser, mas não é. Esforcei-me o bastante para aquietar-me. Para ser bem franco, acho que no geral estou enquadrado entre aqueles que tiram boas notas, por manter a compostura esperada pela maioria, diante das adversidades. O zelo pela ética e pelos padrões dos bons costumes; o proceder de forma pacífica nos relacionamentos; o suportar em silêncio as agruras do dia-a-dia; o abrir mão de direitos pessoais com facilidade; o aceitar os infortúnios da vida sem murmuração; e coisas semelhantes, podem camuflar a realidade de insegurança e intranqüilidade de muitas pessoas. Estas coisas são saudáveis, no entanto não podem ser confundidas como sendo uma prática de real quietação interior.
Por falta de experiência própria, me conformei com as migalhas de um viver quieto e sossegado, que é resultado de um coração tranqüilo, calmo e sereno. Fiz dos meus momentos de bem-estar um prato especial, quando na verdade era só o tira-gosto. Condicionei o “aquietar-se” como sendo algo dependente do ambiente exterior e das condições favoráveis à realização dos meus desejos e prazeres. Associei a quietude ao modo de proceder, e à segurança ilusória do ter; ignorei o “ser” como sendo o verdadeiro acento da tranqüilidade e paz interior. A verdade é que a paz que o mundo dá pode adormecer o coração e impedir de se viver no remanso da paz eterna.
Hoje compreendo que, estar quieto não tem a ver prioritariamente com o estado de espírito de uma pessoa ou com o mundo exterior em que ela vive, mas antes de tudo com a capacidade de sabermos realmente quem somos. Foi o que aconteceu com João Batista. Ele dizia que não era o que diziam dele, porque tinha ciência e consciência quem ele era: “Eu sou apenas o amigo do noivo”. Isso também aconteceu com o apóstolo Paulo. Ele dizia dele: “Pela graça de Deus, sou o que sou”. E com Jesus não foi diferente. Ele afirmou:
“Eu nasci para ser testemunha da verdade”.
Quando sabemos quem somos verdadeiramente e o que Deus é para nós, então acontecerá uma fusão do viver natural com o espiritual, de tal forma que poderemos dizer como o apóstolo Paulo: “Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” E assim sendo, experimentaremos a mesma quietude que ele viveu quando disse:
“A tua graça me basta”.
O salmo 46 inicia apresentando Deus como nosso refúgio, fortaleza e socorro, e fecha nos incitando a vivermos quietos, não apenas como conseqüência do que Ele faz por nós, mas principalmente de que Ele é Deus. Saber que Deus é Deus e que pela sua graça Ele nos fez alvo do seu imensurável amor, é que nos faz viver de forma quieta. É isto que realmente importa, e é assim que quero viver intensamente.